O silêncio que se seguiu não
durou mais que um segundo, mas para Isabel foi uma eternidade. Foi como se
alguém tivesse parado o tempo e congelado ela naquele momento. Dois tiros, os
dois haviam sido acertados. Isso bastou para que ela corresse em direção a
Henrique. Ouviu um grito agudo vindo de Arthur, mas ignorou. Apena seguiu em
direção ao seu amado rezando para que tivesse sido grave. Chegando a ele o viu
ensanguentado. Seu peito estava vermelho e brilhante e seus olhos brilhavam em
lágrimas.
– Oh meu Deus! Henrique, fale
comigo. Diga que está bem, meu amor – disse Isabel jogando-se no chão ao seu
lado, envolvendo-o em seu abraço – Por favor, fale comigo.
Henrique a olhou com seus olhos
azuis, como o céu havia sido um dia. Lágrimas começaram o escorrer como as
águas dos rios quando chegam a uma queda d'agua.
– Isabel – ele sussurrou – Me
perdoe... Eu tentei... Mas não... Consegui.
– Não fala nada. Eu vou cuidar de
você – Isabel beijou-lhe os lábios – sentindo o sabor salgado que vinha deles –
Você vai ficar bem. Você o acertou...
– Não... tão rápido... Quanto...
Ele – Henrique tentou tocar o rosto dela, mas não conseguiu sem a sua ajuda –
Prometa-me... Que vai se cuidar... E que não me esquecerá.
– Sempre. Eu sou tua, lembra? –
Ela chorou mais – Seremos felizes para sempre.
– Seremos...
– Não fale nada. Deixe-me ver
isso aqui...
– Não dá... tempo. Eu não...
tenho... tempo.
– Não faz isso comigo. Não me
deixe aqui sozinha – Isabel o segurou em seus pequenos braços com toda a força
que tinha.
– Eu... te... amo... Isabel
– Eu te amo. Fica comigo, não
morra.
– Eu...
Os olhos de Henrique pararam-nos
de Isabel uma última vez. E ali ficaram. Como quem compadeceu com a dor dela, o
céu fechou-se em nuvens e uma chuva se iniciou. Primeiro fraco, depois ficando
mais forte. E Isabel permaneceu ali chorando com as nuvens, tentando não
explodir de dor. Sentindo seu peito fragmentar-se como um vaso que cai ao chão.
Tentando conter o sangramento em seu coração. Foi sua mãe que a tirou de lá.
Ela não tinha forças para lutar, nem para segurar-se ao corpo de Henrique. Ela
havia se despedaçado por inteira. Mais tarde ela soube que o tiro de Henrique
havia acertado a coxa de Arthur causando
um grande estrago que não possibilitaria uma noite nupcial tão cedo. Por isso
eles adiariam o casamento por algumas semanas. Mas ela também não tinha força
para lutar contra isso. Ela só conseguia chorar e chorar. Nada mais.
As semanas passaram para ela como
se fossem atemporais. Não havia sido rápido, nem longo. Só tinham passado
inviáveis a ela. Ela remoeu a dor da perda do único homem que amara em sua vida
por dias e noites inteiras. Lembrando os beijos, os abraços, a pele macia.
Lembrando-se de uma felicidade que parecia nunca ter lhe pertencido. A saudade
foi tomando conta dela, sufocando-a e consumindo-a coo a chama de uma vela. Ela
não se alimentava direito, não saía do quarto e não falava com ninguém.
Colocaram-lhe joias, preparando-a coo se fosse uma ranha. Mas ela não sentia
assim, não longe de Henrique.
O dia de seu casamento chegou e
ela não sentia nada, estava vazia. Como um rio que secara depois de ter trazido
vida e alegra a todos. Ela vestiu o vestido como se vestisse uma mortalha. Não
sentiu o aroma de campo com o qual a perfumavam.
Enquanto ficou sozinha no quarto
imenso que nunca seria seu sentiu a cabeça girar, e na sua mente veio uma
imagem do seu amado. Vivo, sorrindo-lhe como fizera no seu primeiro encontro.
Ela não ponderou nem um segundo e saiu do quarto caminhando determinada na sua
fraqueza.
É assim que voltamos para o ponto
de partida da nossa história. Ela escondeu-se nas sombras e caminhou durante um
tempo até chegar onde ela queria. Um monte de pedras empilhadas e uma cruz
sobre o topo delas. Isabel ajoelhou-se diante do túmulo e levantou as mãos aos
seios ofegantes.
– Meu Deus! Por que fizeste isso
conosco? Tomou o destino de nossas mãos e jogou-lhe ao vento para que não
conseguíssemos alcança-lo. Não suporto mais respirar sendo um zumbi. Não posso
ser feliz sem ele. Sem o meu único e verdadeiro amor. Permita-me que o
encontre! Abrevias esse sofrimento, sara esta dor, tire-me esse peso das
costas. Eu preciso me sentir inteira novamente.
Ela chorou por horas. Suas
lágrimas lavavam o túmulo de Henrique até que elas secaram. Ela deitou-se, sua
mão sobre o coração. Enquanto ele batia buscando se libertar. Enquanto ele foi
se acalmando e respirando a liberdade que chegara. Ela fechou os olhos e dormiu
como fizera todas as noites, mas com algo diferente. Um sentimento que ela
nunca sentira antes. Caiu num sono profundo e calmo.
Algum tempo depois, ela sentiu um
toque em seu pulso. Uma mão suave e familiar. Ela não precisava abrir os olhos
para ver quem era.
– Senti sua falta - ela disse
ainda de olhos fechados.
– Eu também.
Ela abriu os olhos e viu Henrique
parado ao seu lado. Não como quando o havia visto pela última vez. Ele estava
bem. Como no dia em que o viu na janela do baile. Ele sorriu e confortando
enquanto ela levantava-se.
– Permita-me a honra de mais essa
dança, minha senhora – Perguntou Henrique com falsa cordialidade.
– Claro que sim, meu duque - Ela
disse abraçando a sua imortalidade.
Ele passou a mão em sua cintura e
pegou a sua pequenina mão com delicadeza. Ela o envolveu o ombro dele com seu
braço livre e os dois saíram valsando pelo céu a caminho das estrelas. Eles
estavam juntos e agora seria para sempre. Sem ninguém para impedir a sua
felicidade.
FIM
Nenhum comentário:
Postar um comentário